LEI 3
OCULTE SUAS INTENÇÕES
Mantenha
as pessoas na dúvida e no escuro, jamais revelando o propósito de seus atos.
Não sabendo o que você pretende, não podem preparar uma defesa. Leve-as pelo
caminho errado até bem longe, envolva-as em bastante fumaça e, quando elas
perceberem as suas intenções, será tarde demais.
Parte I: Use objetos de desejo e pistas falsas para
enganar os outros
Se em algum momento da sua
fraude as pessoas tiverem a mais leve desconfiança quanto a suas intenções
estará tudo perdido. Não lhes dê oportunidade de perceber o que você pretende:
disfarce colocando pistas falsas pelo caminho. Use a falsa sinceridade, envie
sinais ambíguos, invente objetos de desejo desorientadores. Incapazes de
distinguir o falso do verdadeiro, elas não podem ver o seu objetivo real.
As pessoas na sua maioria
são como um livro aberto. Elas dizem o que sentem, não perdem oportunidade de
deixar escapar opiniões e, constantemente, revelam seus planos e intenções.
Elas fazem isso por vários motivos. Primeiro, é fácil e natural querer sempre
falar dos próprios sentimentos e planos para o futuro. É difícil controlar a
língua e monitorar o que se revela. Segundo, muitos acreditam que sendo
honestos e francos estão conquistando o coração das pessoas e mostrando a sua
boa índole. Eles estão imensamente iludidos. A honestidade é na verdade uma
faca sem fio, mais sangra do que corta. A sua honestidade provavelmente vai
ofender os outros; é muito mais prudente medir as suas palavras, dizer às
pessoas o que elas querem ouvir, em vez da verdade nua e crua que é o que você
sente ou pensa. Mais importante, sendo despudoradamente franco você se torna
tão previsível e familiar que é quase impossível inspirar respeito ou temor, e
a pessoa que não desperta esses sentimentos não acumula poder.
Se você deseja poder, ponha
imediatamente a honestidade de lado e comece a treinar a arte de dissimular
suas intenções. Domine a arte e você prevalecerá sempre. Elementar para a
habilidade de ocultar as próprias intenções é uma simples verdade sobre a
natureza humana: nosso primeiro instinto é sempre o de confiar nas aparências. Não
podemos sair por aí duvidando da realidade do que vemos e ouvimos — imaginar
constantemente que as aparências ocultam algo mais nos deixaria exaustos e
aterrorizados. Isto faz com que seja relativamente fácil ocultar as próprias
intenções. Basta acenar com um objeto que você parece desejar, um objetivo que
você parece querer alcançar, diante dos olhos das pessoas e elas tomarão a
aparência como realidade. Uma vez com os olhos fixos na isca, elas não notarão
o que você está realmente pretendendo. Na sedução, dê sinais conflitantes, tais
como desejo e indiferença, e você não só os despistará, como inflamará o seu
desejo de possuir você.
Uma tática, que funciona com
freqüência quando se quer armar uma pista falsa, é parecer estar apoiando uma
idéia ou causa que, na verdade, contraria o que você sente. A maioria vai achar
que você mudou de idéia, visto não ser comum brincar com tamanha leviandade com
coisas tão carregadas de emoção como as suas próprias opiniões e valores. O
mesmo se aplica a um objeto do desejo usado como chamariz: pareça querer alguma
coisa pela qual não está nem um pouco interessado, e seus inimigos perderão o
rumo, calculando tudo errado.
Durante a Guerra da Sucessão
Espanhola, em 1711, o duque de Marlborough, chefe do exército inglês, queria
destruir um forte francês importantíssimo que protegia uma estrada vital para a
entrada na França. Mas ele sabia que, ao destruí-lo, os franceses perceberiam o
que ele queria - avançar por aquela estrada. Em vez disso, ele simplesmente
capturou o forte e o guarneceu com algumas das suas tropas, como se o desejasse
para algum propósito particular. Os franceses atacaram o forte e o duque deixou
que ele fosse reconquistado. Novamente de posse do forte, entretanto, eles o
destruíram, imaginando que o duque tinha alguma razão importante para querer
ficar com ele. Agora o forte não existia mais, o caminho estava livre, e
Marlborough pôde facilmente entrar na França.
Use esta tática da seguinte
maneira: não esconda as suas intenções se fechando (com o risco de parecer
misterioso, e deixar as pessoas desconfiadas), mas falando sem parar sobre seus
desejos e objetivos — só que não os verdadeiros. Você matará três coelhos com
uma só cajadada: vai parecer uma pessoa cordial, franca e confiável; ocultará
suas intenções; e deixará seus rivais atordoados tentando achar inutilmente uma
coisa que levarão tempo para descobrir.
Outra ferramenta eficaz para
colocar as pessoas desorientadas é a falsa sinceridade. Elas confundem
facilmente sinceridade com honestidade. Lembre-se — o primeiro instinto é o de
confiar nas aparências, e como as pessoas valorizam a honestidade e querem
acreditar na honestidade dos que as cercam, raramente irão duvidar de você ou
perceber o que você está fazendo. Parecer que está acreditando no que você
mesmo diz dá um grande peso às suas palavras. Foi assim que Iago enganou e
destruiu Otelo: diante da intensidade das suas emoções, da aparente sinceridade
da sua preocupação com a suposta infidelidade de Desdêmona, como Otelo poderia
desconfiar dele? Foi assim também que o grande charlatão, Yellow Kid Weil,
tapou os olhos das suas vítimas: parecendo acreditar tanto no objeto-isca que
acenava diante deles (um cavalo falso, um cavalo de corrida apresentado como
uma barbada), ficava difícil duvidar da sua realidade. Claro que é importante
não exagerar nessa área. A sinceridade é uma arma traiçoeira: aparente estar
apaixonado demais e despertará suspeitas. Seja uma pessoa comedida e em quem se
possa acreditar, ou a sua artimanha parecerá a fraude que ela é.
Para que a sua falsa
sinceridade seja uma arma eficaz ocultando as suas verdadeiras intenções, adote
a fé na honestidade e na franqueza como valores sociais importantes. Faça isso
da forma mais pública possível. Enfatize a sua posição quanto a isso, divulgando
ocasionalmente alguma idéia sincera — mas só aquela realmente sem importância
ou irrelevante, é claro. O ministro de Napoleão, Talleyrand, era mestre em
despertar a confiança das pessoas revelando um suposto segredo. Esta confiança
fingida —a isca — despertava em seguida a confiança verdadeira do outro.
Lembre-se: Os maiores
impostores fazem de tudo para encobrir suas virtudes traiçoeiras. Cultivam um
ar de pessoa honesta, numa área, para disfarçar a sua desonestidade em outras.
A honestidade é simplesmente mais uma isca no seu arsenal.
Parte II: Disfarce as suas ações entre cortinas de fumaça
Trapacear é sempre a melhor
estratégia, mas as melhores trapaças exigem uma cortina de fumaça para distrair
a atenção das pessoas do seu verdadeiro propósito. O exterior afável – como a
inescrutável cara-de-pau – e quase sempre a cortina de fumaça perfeita,
escondendo suas intenções por trás do que confortável e familiar. Se você
conduzir a vítima por um caminho desconhecido, ela não perceberá que você a
está levando para uma armadilha.
Lembre-se: os paranóicos e
desconfiados são os mais fáceis de enganar. Conquiste a sua confiança numa área
e você terá a cortina de fumaça que turva a visão deles em outra, deixando que
você se aproxime de manso e os arrase com um golpe devastador. Um gesto
prestativo ou aparentemente honesto, ou que sugira a superioridade do outro —
estas são táticas diversionistas perfeitas. Adequadamente montada, a cortina de
fumaça é uma arma poderosíssima.
Se você acha que trapaceiros são aquela gente pitoresca que ilude
com mentiras elaboradas e histórias incríveis, está muito enganado. Os maiores
impostores são os que utilizam uma fachada suave e invisível que não chama
atenção. Eles sabem que gestos e palavras extravagantes levantam logo suspeita.
Pelo contrário, eles envolvem o seu objetivo numa aura familiar, banal,
inofensiva.
Depois que você tiver
atraído a atenção das suas vítimas para o familiar, elas não notarão a fraude
que está ocorrendo pelas suas costas. A origem disso está numa verdade muito
simples: as pessoas só conseguem focalizar uma coisa de cada vez. E realmente
muito difícil para elas imaginar que a pessoa suave e inofensiva com quem estão
lidando está ao mesmo tempo tramando outra coisa. Quanto mais cinza e uniforme
a fumaça da sua cortina, melhor ela esconde as suas intenções. Nas iscas e
pistas falsas discutidas na Parte 1, você distrai ativamente as pessoas; na
cortina de fumaça, você ilude a sua vítima, atraindo-a para a sua teia. Por ser
tão hipnótica, esta é com freqüência a melhor maneira de dissimular suas
intenções.
A forma mais simples de
cortina de fumaça é a expressão facial. Por trás de um exterior brando,
ilegível, podem estar sendo tramados todos os tipos de ações violentas e
prejudiciais, sem serem percebidas. Esta é uma arma que a maioria dos homens
poderosos na história aprendem a usar à perfeição. Dizia-se que ninguém era
capaz de ler o rosto de Franklin D. Roosevelt. O barão James Rothschild teve
por hábito, durante toda a sua vida, disfarçar o que estava realmente pensando
com sorrisos afáveis e olhares indefiníveis. Stendhal escreveu a respeito de
Talleyrand, “Jamais um rosto serviu tão pouco de barômetro”. Henry Kissinger
fazia seus adversários numa mesa de negociação chorar de tédio, com seu tom de
voz monótono, seu olhar inexpressivo, seus detalhamentos intermináveis; e aí,
quando já estavam com o olhar esgazeado, ele os atingia de repente com uma
relação de termos ousados. Apanhados desprevenidos, intimidavam-se facilmente.
Como explica um manual de pôquer, “Na sua vez de jogar, o bom jogador raramente
é um ator. Pelo contrário, ele pratica um comportamento frio que minimiza os
padrões legíveis, frustra e confunde o adversário e permite mais concentração”.
Um conceito adaptável, a
cortina de fumaça pode ser praticada em vários níveis, todos jogando com os
princípios psicológicos da distração e da desorientação. Uma das cortinas de
fumaça mais eficazes é o gesto nobre. As pessoas querem acreditar que gestos
aparentemente nobres são autênticos, porque é uma crença agradável. Elas
raramente notam como eles enganam.
O comerciante de peças de
arte Joseph Duveen se viu certa vez diante de um terrível problema. Os
milionários que pagavam tão bem por seus quadros não tinham mais tanto espaço
nas suas paredes, e, com os impostos sobre heranças subindo cada vez mais,
parecia pouco provável que continuassem comprando. A solução foi a National
Gallery of Art, em Washington, D.C., que Duveen ajudou a criar em 1937
conseguindo que Andrew Mellon doasse a sua coleção. A National Gallery era a
fachada perfeita para Duveen. Num só gesto, seus clientes fugiam aos impostos,
abriam espaço nas paredes para novas aquisições e reduziam o número de quadros
no mercado, mantendo a pressão que aumentava o seu preço. Tudo isto enquanto os
doadores aparentavam ser benfeitores da sociedade.
Outra cortina de fumaça
eficaz é o padrão, quando se estabelece uma série de ações que seduzem a vítima
e a fazem acreditar que as coisas continuarão sempre da mesma maneira. O padrão
joga com a psicologia da expectativa: nosso comportamento se encaixa no padrão,
ou assim gostamos de pensar.
Em 1878, o barão ladrão
americano Jay Gould criou uma empresa que começou a ameaçar o monopólio da
companhia de telégrafos Western Union. Os diretores da Western Union resolveram
comprar a empresa de Gould — foi preciso dispor de uma quantia considerável,
mas eles achavam que tinham conseguido se livrar de um irritante adversário.
Poucos meses depois, entretanto, Gould estava lá de novo, queixando-se de que
fora tratado injustamente. Ele abriu uma segunda empresa para competir com a
Western Union e a sua nova aquisição. A mesma coisa voltou a acontecer: a
Western Union comprou a empresa para fazer com que ele calasse a boca. Logo o
padrão voltou a se repetir pela terceira vez, mas agora Gould atacou na
jugular: de repente, ele iniciou — e logo conseguiu — uma sangrenta tomada de
controle hostil da Western Union. Ele tinha estabelecido um padrão que iludiu
os diretores da empresa fazendo-os achar que o seu objetivo era ser comprado
por um preço razoável. Depois de comprar, eles relaxavam e não percebiam que
estavam na verdade apostando mais alto. O padrão funciona muito bem porque a
pessoa se ilude esperando o contrário do que você está realmente fazendo.
Outra fraqueza psicológica
que serve de base para se construir uma cortina de fumaça é a tendência que as
pessoas têm de confundir aparência com realidade — a idéia de que se alguém
parece fazer parte do seu grupo, é porque faz realmente. Este hábito faz da
camuflagem uma fachada muito eficaz. O truque é simples: você simplesmente se
mistura com as pessoas ao seu redor. Quanto mais você se misturar, menos
suspeito se tornará. Durante a Guerra Fria das décadas de 1950 e 1960, como
hoje se sabe, muitos funcionários públicos britânicos passaram informações
secretas para os soviéticos. Ninguém descobriu nada durante anos porque eles
eram, aparentemente, sujeitos honestos, tinham freqüentado boas escolas e se
adequavam perfeitamente ao modelo da rede de ex-alunos de escolas de prestígio.
A mistura é a cortina de fumaça perfeita para a espionagem. Quanto mais você se
misturar, melhor conseguirá disfarçar suas intenções.
Lembre-se: é preciso
paciência e humildade para apagar as suas cores brilhantes e colocar a máscara
da pessoa insignificante. Não se desespere por ter de usar esta máscara apagada
— quase sempre é a sua ilegibilidade que atrai os outros e faz você parecer
poderoso.
O INVERSO
Não há cortina de
fumaça, pista falsa, insinceridade, ou outra tática diversionista qualquer que
disfarce as suas intenções se você já tiver fama de impostor. Com a idade e o
sucesso que você vai alcançando, se torna cada vez mais difícil disfarçar a sua
esperteza. Todos sabem que você é dissimulado; continue bancando o ingênuo e
corra o risco de parecer um grande hipócrita, o que limitará seriamente o seu
espaço de manobra. Nesses casos, é melhor assumir, aparentar ser um patife
honesto, ou melhor, um patife arrependido. Não só vão admirá-lo por sua
franqueza, como, o que é mais estranho e maravilhoso, você vai conseguir
continuar com as suas artimanhas.
À medida que ia ficando mais
velho, P.T. Barnum, o rei da fraude no século XIX, foi aprendendo a aceitar a
sua reputação de grande impostor. Num determinado momento, ele organizou uma
caça a búfalos em Nova Jersey, completa, com índios e alguns búfalos
importados. Ele divulgou a caçada como sendo autêntica, mas o resultado foi tão
artificial que a multidão, em vez de ficar zangada e pedir o dinheiro de volta,
se divertiu muito. Eles sabiam que Barnum trapaceava o tempo todo; era o
segredo do seu sucesso e gostavam dele por isso. Aprendendo a lição, Barnum
parou de esconder as suas artimanhas, chegando até a revelar suas fraudes numa
autobiografia. Como escreveu Kierkegaard, “O mundo quer ser enganado”.
Finalmente, embora seja mais
sábio distrair a atenção dos seus propósitos, apresentando um exterior suave e
familiar, há momentos em que o gesto colorido, visível, é a tática
diversionista correta. Os grandes charlatões saltimbancos da Europa nos séculos
XVII e XVIII usavam o humor e o divertimento para iludir suas platéias.
Deslumbrado com o espetáculo, o público não percebia as verdadeiras intenções
dos charlatões. Assim, o próprio astro charlatão aparecia na cidade numa
carruagem negra puxada por cavalos negros. Palhaços, funâmbulos e artistas de
espetáculos de variedade o acompanhavam, atraindo o povo para as suas
demonstrações de elixires e poções milagrosas. O charlatão fazia o divertimento
parecer o assunto do dia quando, na verdade, o assunto do dia era a venda dos
elixires e poções milagrosas.
Espetáculo e divertimento
são, nitidamente, excelentes artifícios para dissimular as suas intenções, mas
não podem ser usados indefinidamente. O público se cansa e desconfia, e acaba
percebendo o truque. Pessoas poderosas com exteriores afáveis, por outro lado —
os Talleyrand, os Rothschild, os Selassie —, podem praticar suas dissimulações
no mesmo lugar a vida inteira. Seu ato não se desgasta, e raramente levanta
suspeitas. A cortina de fumaça colorida deve ser usada com cautela, portanto, e
só na ocasião certa.
“Não deixe que o vejam como impostor, mesmo que
hoje seja impossível não o ser. Que a sua maior esperteza esteja em dissimular
o que parece ser esperteza.”
Baltasar Gracián
“Já ouviu falar de um general
muito hábil que pretende surpreender uma cidadela anunciando seus planos ao
inimigo? Oculte os seus propósitos e esconda o seu progresso; não revele a
extensão dos seus objetivos até ser impossível se opor a eles, até terminar o
combate. Conquiste a vitória antes de declarar a guerra. Em resumo, imite
aqueles guerreiros cujas intenções ninguém sabe, exceto o país destruído por
onde eles passaram.”
(Ninon de Lenclos,
1623-1706)
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