terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

Um Exercício de Atenção

Plena Atenção, Eficaz Ação
sala de casa
Para o bom observador, uma tarefa complexa, tende a se tornar coisa bastante simples...
De onde ele estava, podia ver todo movimento da casa. Era começo de inverno, e nessas ocasiões a casa ficava repleta de mosquitos. Bastavam os primeiros trovões, e então todos saiam de suas tocas, para fundarem novas colônias. Quantos insetos existiriam no mundo dos insetos? Ele conhecia muito pouco sobre suas origens, uma vez que se especializara desde cedo, apenas em seus hábitos naturais, que era a coisa necessária à sua sobrevivência.

Afinal de contas, aquilo era a única coisa que para ele importava. Mas agora, refletindo melhor, era estranho aquele sentimento, aquele questionamento. Era algo que vinha do fundo da sua mente, ou seria alma? Era um pensamento que não conseguia reter. Questionar a origem das coisas era uma novidade para si. Lembrou que entre seus amigos, nunca escutara conversa alguma sobre isso, pois a coisa era considerada uma espécie de tabu, algo que devia ser, naturalmente, evitado.

Pensou em ir falar com a sua mãe sobre aquilo, talvez ela soubesse mais para lhe esclarecer, nem que fosse o básico. Ao contrário dos outros da sua idade, ele conversava coisas assim com sua mãe. Ela sempre lhe dera essa confiança, tanto que agora a considerava, além de mãe, como uma grande amiga. O problema é que se aproximava da hora do jantar, e todos aqueles insetos pelas paredes da casa, desviavam sua atenção, disso que classificou como um chamado interior.

Essa dúvida teria que esperar um pouco mais. Depois de anos de prática, talvez fosse próprio de sua fisiologia, pois conseguia, se quisesse, ficar completamente imóvel. Algumas vezes fazia de propósito, apenas para ver a reação das pessoas da casa. Como as pessoas da casa já o conheciam, não se importavam com isso. Assim, ele ficava um tempão, estático, parado. Podia ser na sala, podia ser no quarto, e todos respeitavam, deixando-o quieto.

Lembrou de um documentário sobre um campeão olímpico. Disseram no filme, que ele era capaz de andar tão sutilmente, que parecia estar parado. Seus amigos também diziam o mesmo a seu respeito. E embora a convivência na casa fosse boa, sabia que não podia haver exageros. Ser discreto era a certeza de um convívio harmonioso. A correta higiene, também era um fator de longevidade, pois as pessoas gostam de ambientes limpos, ao menos aquelas que ali moravam.

E como ele também era um morador do local, seguia as regras da casa. Mas isso não era problema, pois desde cedo, aperfeiçoara suas técnicas de limpeza. Uma senhora mais velha, que ele considerava como uma segunda mãe, o ensinara muita coisa, que agora sabia ser bastante útil e necessário para uma vida saudável.

Sobre insetos ele conhecia bastante. Sabia por exemplo, que eles não conseguem ficar voando para sempre, e eventualmente, precisam pousar nas paredes ou no chão, para descansar um pouco. Era nesse momento que ele deveria agir. Se eles descansassem o bastante para alçar vôo outra vez, sua investida seria em vão. Assim, o ideal era fazer a abordagem, imediatamente, logo após seu pouso. Havia uma tolerância do tempo de permanência deles na mesma posição, após o pouso, e embora nunca soubesse de quanto era esse tempo, a prática que tinha desenvolvido com a experiência, superava essa falta de informação.

Os menores eram mais irrequietos, mas em compensação, permaneciam parados nas paredes mais tempo que os maiores. Estes, os maiores, além de muito rápidos na retomado de seus vôos, quase não ficavam parados, por isso eram mais difíceis de serem capturados. Naquele momento, observando as coisas à sua volta, se deu conta do quanto era imenso o mundo fora daquela casa. Mas, ele era muito apegado àquela família. Ali todos o tratavam bem. Era uma comunhão onde o respeito mútuo predominava.

A verdade é que se sentia bem ali dentro, pois não havia muito barulho e as pessoas adoravam coisas, tais como, comida orgânica, biodiversidade, equilíbrio natural das espécies. Mantinham enfim, uma postura ecologicamente correta, por assim dizer. Por isso mesmo, não tinha problemas de alergias com os inseticidas, o que certamente não aconteceria, por exemplo, na casa do vizinho, onde a toda semana, uma nova marca de veneno era testada.

Aprendera na escola, que uma classe de insetos do tipo joaninha, ou percevejos do mato, deveriam ser evitados, pois exalavam um forte e tóxico cheiro quando se sentiam ameaçados. Ele lembrava da história de uma guerra entre os primeiros clãs das lagartixas, onde uma bomba de essência de joaninha fora lançada sobre uma cidade distante, no oriente, e diziam que por lá, nunca mais foi visto nenhuma lagartixa.

Mas, ali naquela casa era diferente, pois ele, como Lagartixa, era muito bem vindo, e era até considerado um elemento necessário à limpeza, e como fator de equilíbrio natural do nível de insetos, daquele ambiente.


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