O seguinte relato
foi escrito por Roger McLaughlin, membro d`A Igreja de Jesus Cristo dos Santos
dos Últimos Dias e médico que serviu na Força Aérea dos Estados Unidos da
América, na Guera do Vietnã. Roger e seu amigo Don, tinham saído para fazer
algumas verificações, enquanto Tracy, outro de seus amigos, cuidava de seus
afazeres, que consistian em ajudar a preparar os cadáveres dos soldados mortos
para serem embarcados para os Estados Unidos.
“Entramos por aquela
porta, numa enorme sala, onde Tracy estava trabalhando. Um forte odor de
desinfetantes químicos empregnava o frescor do ambiente”.
“Tracy estava em pé,
ao lado de um corpo quase, deitado em uma das mesas frias de metal. Havia mais
oito corpos, em outras mesas semelhantes. Alguns deles ainda estavam vestidos
com uniformes encharcados de lama e sangue. Outros estavam nus, com apenas uma
toalha no corpo. À sala estava bem iluminada, e não dava impressão de estar-se
num necrotério, exceto pela presença de corpos”.
“Tracy olhou para
nós e sorriu: Ei rapazes, o que estão fazendo aqui?” Nós sorrimos também e lhes
falamos a respeito das jaquetas que iríamos mandar fazer. Seu rosto iluminou-se
e ele se nos certificou de que desejava uma também, mas que não poderia ir, até
que terminasse de limpar os corpos...
“Eu e Don pegamos os
desinfetantes, trapos e passamos a trabalhar com a vítima que se encontrava
mais proxíma. Enquanto isso, conversamos a respeito da guerra em geral, e de
como esses jovens haviam sido mortos.
“Primeiro, tiramos-lhes
os uniformes, lavamos e esfregamos seus corpos com um desinfetantes verde e
grosso, depois enxaguamos com água limpa e os enxugamos. Trabalhamos em três e
conversando, não levou muito tempo para limparmos todos”.
“Depois, então, Tracy pegou os longos e
pesados sacos pretos para colocar os corpos. Pusemos um saco ao lado de um
cadáver, colocamo-lo dentro, juntamente com os pertences dos soldados. Deixamos
os sacos abertos, uma vez que o sargento teria de inspecioná-los, terminar os
papéis e fechar pessoalmente cada saco”.
“Quando estávamos
quase para terminar, eu e Tracy começamos a limpar as mesas e o chão, enquanto Don fazia uma
inspeção final.
“Já estavamos para
sair, quando Don perguntou: Ei, é verdade que certas funções do corpo de uma
pessoa continuam a trabalhar, de alguma forma, mesmo depois de morta?” Olhei
para ele e disse: Bem, ouvi dizer que os cabelos continuam crescendo durante
algumas horas, mas na realidade, não é assim perceptível. A mente pode
funcionar por alguns minutos, depois que o coração pára, mas acho que isso é
tudo. Por que?
“Bem, o que você diz a respeito das
grândulas lacrimais? Podem funcionar após a morte?
“Nunca ouvi falar de coisa semelhante,
embora ache possível... Mas, por que todas essas perguntas?
“Bem, pensei que
houvéssemos deixado um pouco de água nos olhos deste rapaz, ao enxuguá-lo, mas
já enxaguei duas vezes, e a água continua escorrer. Acho que ele está
chorando.”
“Eu e Tracy
levantamos e dirigi-mos até o corpo. Ao olharmos o rosto do jovem que deveria
ter dezoito anos de idade, e que fora atingido por uma granada, vimos uma única
lágrima escorrer do canto do olho, até chegar à orelha.
“Esse homem está
vivo, murmurei. A reação foi imediata, como se já houvéssemos feito aquilo uma
centena de vezes. Don apanhou as chaves da ambulância e abriu a porta para nós,
enquanto levávamos o corpo para fora. Colocamo-lo na padiola e, com Don
dirigindo, encaminhamo-nos ao 71º
Hospital de Evacuação. A sirene tocava, anunciando nossa passagem.
“Enquanto a
ambulância avançava aos solavancos, Tracy enxugou uma outra lágrima do rosto do
rapaz. Olhei a chapa de identidade, para verificar o nome do jovem, pois queria
dar-lhe uma benção. Notei, então, bem embaixo da chapa três pequenas letras:
SUD. Coloquei as mãos sobre a sua cabeça e murmurei uma oração quase inaudível:
Pela autoridade do Sacerdócio de Melquisedeque, que possuo, e pelo poder de
Jesus Cristo, ordeno-lhe que permaneça vivo até que possamos conseguir os
medicamentos necessários para salvar sua vida.
“Tracy, olhou para
mim e enxugou uma lágrima de seus próprios olhos, esboçou um sorriso grato, e
baixou a cabeça em oração silenciosa.
“A sirene e nós
cruzamos a rua asfaltada, em direção as portas do Hospital. Os médicos do
Exército ajudaram a retirar o Soldado da ambulância e levá-lo para a sala de
emergência. Dois Outros médicos começaram a fazer perguntas e dissemo-lhes tudo
que sabíamos. Depois, retiraram-se da entrada de emergência sem dizer uma
palavra, e nós ficamos sentados do lado de fora, num banco de madeira, por mais
de duas horas.
“Discutíamos ainda
sobre se devíamos ou não sair, para ver o negócio das camisetas, quando um dos
médicos apareceu, vindo em nossa direção. Ele parou e disse: “Alegro-me de que
tenham esperado, foram as suas primeiras palavras, Quero-lhes relatar um
milagre que acaba de acontecer. Aquele rapaz que está lá dentro, de acordo com
todos os critérios médicos, deveria estar morto. Foi ferido em nove lugares. Já
havia perdido tanto sangue, que não sangrava mais.
“O caração estava
tão fraco que, não se podia ouvir nem uma batida ou sentir a sua pulsação.
Estava tão fraco, que não se podia perceber que respirava. Achava-se legalmente
morto, mas na realidade estava vivo.
“Estava tão fraco,
que não podia mover-se ou falar, e por isso permaneceu naquela cama do
necritério, e chorou. Ele teve muita sorte de vocês notarem suas lágrimas, pois
do contrário teria morrido logo. Para dizer a verdade, deveria ter morrido,
mesmo depois de vocês terem trazido aqui.
Embora-lhe
tivéssimos dado mais de dois litros de sangue, e tratado suas feridas da melhor
maneira possível. Ainda tinha forças para recuperar-se, mas finalmente
conseguiu. “O médico fez uma pausa, e depois olhou bem para nós. Durante os
quinze meses que tenho trabalhado aqui no Vietnã, nunca vi um milagre assim. Ao
falar, olhava para o chão. “Querem saber de uma coisa? Aquele soldado jovem
soldado olhou para mim, há alguns minutos, deu um sorriso muito fraco e disse:
“Sacerdócio”. O que vocês acham que ele queria dizer com isso? E, sem esperar a
resposta, o médico voltou-se e passou vagarosamente pelas portas abertas do
Hospital.
“Agora que me
encontro aqui, exposto ao sol, sei que um dia voltarei e explicarei tudo ao
médico. Mas, no momento quero apenas descansar e desfrutar da alegria haver participado de um milagre nos dias
modernos”. (Roger McLaughlin, “Um Domingo no Vietnã”, A Liahona, agosto de
1971, p. 24.)
VALDIR S MALAGUETA
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