domingo, 8 de janeiro de 2012

Sete conselhos para escrever uma resenha sem ler o livro


Muitas críticas que você lê hoje na grande imprensa foram feitas por pessoas que não leram a obra em questão por inteiro. Creio que isso acontece por três motivos: pouco tempo, pouco espaço, pouco pagamento. Tomando por base os textos que saíram sobre meus livros, acredito que apenas metade das resenhas são escritas por críticos que realmente leram a obra resenhada.

Portanto, os resenhistas têm que lançar mão de vários truques para compor seu texto. Reparei na repetição de alguns e resolvi fazer um breve manual de “Como escrever uma resenha sem ler o livro resenhado”.
Vamos aos sete passos necessários para esta não tão árdua tarefa:
1-) Se você não leu o livro, uma boa saída é contar várias curiosidades sobre ele e seu autor. Você pode encontrá-las no release enviado pela editora, na orelha e na contracapa do livro, e, é claro, na internet. Colocando várias destas curiosidades, o leitor vai pensar que você é um expert em literatura, um livre docente que defendeu tese sobre o autor em questão.
2-) É muito importante você fazer um resumo do livro. Dá a impressão de que você leu todas as suas páginas e conseguiu condensar tudo num só parágrafo. Geralmente o release já traz uma boa sinopse. Caso a editora do livro não tenha uma boa assessoria de imprensa que mande um resumo publicável, é só pedir ajuda de São Google. Porém, se você tiver o azar de ter que fazer a primeira resenha do livro, peça ao próprio autor que lhe conte a história. Lembro que certa vez fiquei mais de uma hora no telefone contando a história de um livro a um jovem repórter do finado Jornal do Brasil. Como sou ruim para contar histórias oralmente, no dia seguinte saiu uma péssima resenha sobre o livro. Mea culpa, mea maxima culpa.
3-) Faça comparações com outros livros do autor que você realmente leu. Isso dará mais substância ao seu texto. Eu, por exemplo, realmente li Fogo Pálido e Lolita. Caso não tenha lido outro livro do autor, faça comparações com livros de outros escritores. Uma crítica, certa vez, comparou o meu “Os vermes” com “Memórias Póstumas de Brás Cubas” só porque o livro de Machado é dedicado a um verme. Obviamente, um não tinha nada a ver com o outro, nem quanto a estilo nem quanto à história, a não ser o uso da palavra verme.
4-) Coloque algo que pareça uma teoria literária profunda. Não precisa ser, basta parecer.
5-) Roubei esta ideia de uma resenha anterior sobre o livro. Não tenha pudor de fazer isso. Só não esqueça de mudar algumas palavras para que o aturo do texto não perceba o furto. Por conta deste item, a primeira resenha de um livro é quase sempre a mais importante, pois muitos dos resenhistas futuros vão lê-la e repetir suas opiniões. Principalmente se não leram o livro. Isso constrói uma certa unanimidade em relação ao livro, o que é péssimo.
6-) Cite um trecho do livro. É claro que muitas vezes você só vai ter lido justamente aquele trecho, mas o leitor de sua resenha não sabe disso e pensará que você realmente escolheu uma parte especial do livro. Curiosamente, o resenhista que não lê todo o objeto resenhado quase sempre cita e comenta algo das primeiras páginas, as únicas que ele leu. Mas há que se tomar cuidado com isso. Numa crítica recentemente publicada na Folha de S.Paulo, por exemplo, o resenhista falou algo sobre a paternidade de um personagem de certo livro, informação dada no primeiro capítulo do livro. Se ele tivesse lido o segundo capítulo, saberia que o pai do personagem era outro. Ou seja, o melhor é fazer alguma afirmação neutra e colocar o trecho, sem se arriscar demais.
7-) Quanto tiver que opinar, apenas repita o senso comum que há sobre este autor. Por exemplo, se a resenha é sobre o Luis Fernando Verissimo, diga que ele é engraçado; se é sobre Rubem Fonseca, fale que seu estilo é seco; se é sobre Dalton Trevisan, declare que ele é o rei da concisão.
8-) Outro truque básico é contar a biografia do autor. É claro que na maioria das vezes ela não interessa nem um pouco à história, nem fará você gostar mais do livro ou entendê-lo melhor. Mas ajuda a encher o espaço. Além disso, também é uma forma do jornalista contar uma narrativa, pois, já que não conhece bem a história contada pelo livro, pelo menos conta a vida de seu autor.
Enfim, deixo aqui aos futuros resenhistas a minha humilde contribuição. Que talvez também tenha alguma utilidade para os leitores.
por Jose RobertoTorero Uol

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